Seminário sobre Justiça Juvenil e Criminalidade Violenta
Enquadrado pela criação da Comissão de Análise Integrada da Delinquência Juvenil e Criminalidade Violenta (CAIDJCV), o terceiro Seminário sobre Delinquência Juvenil pretendeu debater a visão das diferentes áreas interministeriais sobre o tema
Mesa de encerramento do Seminário
Numa organização conjunta da DGRSP e da Universidade Lusófona, realizou-se no passado dia 19 de abril, o III Seminário sobre Delinquência Juvenil, este ano, subordinado ao tema Justiça Juvenil e Criminalidade Violenta.
O Seminário contou, presencialmente, no Auditório XX, com mais de 80 participantes e com mais de 200, via zoom.
O tema escolhido teve por base a criação da Comissão de Análise Integrada da Delinquência Juvenil e Criminalidade Violenta (CAIDJCV), no âmbito do Ministério da Administração Interna (MAI).
A DGRSP convidou um conjunto de membros da CAIDJCV para participarem neste evento, permitindo conhecer a visão das diferentes áreas interministeriais sobre o tema.
Participaram ainda elementos convidados pela Universidade Lusófona e membros da PSIJUS, com uma análise mais académica desta problemática.
Das temáticas abordadas destacam-se:
- A delinquência juvenil não pode ser somente balizada no âmbito da Lei Tutelar Educativa, isto é, a praticada por crianças/jovens entre os 12 e os 16 anos. Há comportamentos delinquentes antes dos 12 anos e entre os 16 e os 21 anos, ou mesmo como avaliado no Relatório de Segurança Interna (RASI) até aos 25 anos, como referenciado pela Polícia Judiciária. Então poderíamos falar de uma delinquência infantil, juvenil e já adulta na numa designação mais abrangente.
- No RASI 2021 registava-se um aumento da delinquência juvenil no âmbito da LTE de 7,3%. No RASI 2022 o aumento é de 50,6%. Mas se a comparação for entre 2019, pré-pandemia, e 2022, o aumento é “somente” de 7,3%.
- Para a análise deste tema, não podemos esquecer que o conceito de família tem vindo a mudar, em que se nota, nestes jovens com comportamentos delinquentes, uma falta de afetos na infância, uma desorganização sistémica nos bairros de origem (Zonas Urbanas Sensíveis), com uma evolução do comportamento dos grupos / gangs, muito centrada na Área Metropolitana de Lisboa, Setúbal e Porto.
- Esta mudança do conceito de família, altera também o conceito de “vinculação” na infância, afetando o crescimento com alterações ao nível das estruturas cerebrais. A vivência de muitos eventos adversos tem um impacto cumulativo.
- O comportamento delinquente é também um problema de saúde pública.
- Vivemos num mundo em que importa reforçar o trabalho em rede.
- Os comportamentos violentos persistentes, desde idade precoce, são já um preditor de comportamentos violentos no futuro. De facto, o maior preditor é a história prévia de violência praticada ou presenciada.
- A pandemia teve um impacto muito relevante ao nível da saúde mental, em especial nos jovens até aos 25 anos. Os estudos indicam o aumento de relatos de maior ansiedade e uso de ansiolíticos. O aumento da violência doméstica, perca de rendimentos dos jovens e suas famílias, contribuíram para o aumento do “mal-estar”, do stress, do consumo de álcool, de medicamentos e de drogas.
- Os comportamentos aditivos e dependências têm um grande impacto na vida dos jovens, como as neurociências nos têm vindo a demonstrar. Por isso, torna-se relevante uma abordagem colaborativa, no contexto de uma intervenção junto de jovens em perigo de comportamentos aditivos.
- A Lei de Proteção de Crianças e jovens em Perigo (LPCJP) e a LTE são leis “primas”, que deveriam funcionar, em termos práticos de forma articulada. Mas isso não acontece na realidade. De facto, regista-se uma dificuldade das entidades de primeira linha, a começar pela escola, de sinalizarem as situações e de as referenciarem em função do perigo e em função da prática de factos qualificados pela lei como crime.
- As crianças com processos de promoção e proteção que apresentam comportamentos de perigo na infância e na juventude, num total de 7,7%, apresentam comportamentos graves antissociais. Uma parte destas crianças e jovens está em acolhimento residencial, que não funciona adequadamente com estas crianças “problemáticas”. Mais de 50% dos jovens internados em Centros Educativos (CE) vêm de acolhimento residencial da promoção e proteção.
- Parece existir uma falência coletiva do sistema, em que todos falham à criança, sem respeitarem o seu tempo. Por exemplo é inadmissível o tempo que medeia entra a prática do facto e a aplicação da medida tutelar educativa.
- O sistema de promoção e proteção e o sistema tutelar educativo não dispõem dos recursos humanos necessário e adequados. No caso dos CE a falta de TPRS é de grande gravidade. Isso constitui, para a Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos CE, uma “violação dos diretos das crianças à guarda do Estado”.
- Um bom exemplo de que o direito das crianças e jovens não é uma matéria prioritária, fica evidente na não regulamentação do acolhimento residencial e na não regulamentação, neste caso desde os anos 80, do regime aplicável aos jovens com mais de 16 anos.
- A Procuradoria Geral da República, através do Gabinete da Família, da criança, do jovem, do idoso e contra a violência doméstica, tem vindo a desenvolver um “Plano de Ação Tutelar Educativa”, para consciencializar todas as entidades intervenientes na necessidade de participação ao Ministério Público dos factos qualificados pela lei como crime de que tenham conhecimento. Sem participação não ´possível a abertura de Inquéritos Tutelares Educativos, pelo que a PGR publicou o Manual com o título: “Educar para o direito, uma forma de também proteger”.
- A revisão da LTE, de 2015, criou a expectativa de um aumento dos processos tutelares educativos, o que não veio a acontecer.
- Também as Equipas da DGRSP têm que ser mais assertivas nas propostas de medida tutelar educativa, evitando propor medidas de execução na comunidade, como o acompanhamento educativo, quando é evidente que o jovem não o irá cumprir. Também a utilização de Relatórios Sociais Simplificados em casos de maior complexidade não é o mais adequado.
- Foi realçada a importância de uma abordagem psico-inclusiva que evite a estigmatização e a entrada no sistema penal, e de uma intervenção precoce, dirigida não só à criança, como também à família, incluindo programas de competências parentais e programas dirigidos aos jovens (ex: O mentoring; o programa Triple P, etc…).
No final da iniciativa, foram apresentadas, por Carina Quaresma e António Leitão da Silva, em representação do MAI, as primeiras conclusões da CAIDJCV.